sábado, 23 de fevereiro de 2008

'Baixio das Bestas'


"Baixio das Bestas"

Visionei hoje, o meu primeiro grande filme do ano!

Esta pérola do avançado ciname brasileiro, realizado por Claudio Assis, coloca-nos perante uma reflexão filosófica acerca da condição humana.

Filmado com uma veracidade impressionante, baseado no processo intrínseco das desigualdades sociais, culturais e educacionais, que proporciona, aos degredados da vida, um ambiente rústico de pobreza, de miséria, de prostituição, de loucura, de dor em pensamento, de tudo e de nada... É a condição humana na sua forma mais animalesca. É um filme absolutamente perturbador, no entanto obrigatório e necessário!!!

Vencedor do "Tiger Award" no 36º Festival internacional de Cinema de Rotterdam, Baixio das Bestas possivelmente nem chegará a Portugal, faz parte daquele segmento de cinema do qual, "as massas" não gostam - é muito duro e cansa ter que pensar, reflectir e questionar... - no entanto, este filme ficará na história do cinema como a representação cinematográfica do decadentismo humano, em que prevalece uma visão pessimista do mundo, onde a inclinação estética é marcada pelo subjectivismo moral, pela descoberta das inconsciências universais e pelo gosto das dimensões misteriosas da existência.

Absolutamente essencial e obrigatório!!!












Case Study!!!


No Expresso de hoje, vem uma crónica deliciosa, de José Fialho Gouveia, acerca da inacreditável estupidez de "alguns!!!" americanos.

Abaixo, na integra, a respectiva crónica.

«É a Hungria, estúpida!»

"Na versão norte-americana do concurso Sabe Mais do que um miúdo de 10 Anos, aconteceu um hilariante momento de televisão. Hilariante e ao mesmo tempo preocupante, pois mostra uma das facetas mais negras dos EUA: o umbiguismo e a falta de noção do resto do mundo. A pergunta nem era extremamente difícil: 'De que país europeu Budapeste é a capital?'. A concorrente, uma ex-participante do American Idol (Ídolos, na SIC), ficou estupefacta com semelhante questão e exclamou: «Eu pensava que a Europa era um país...». O descalabro continuou. Deduziu que em princípio se falava francês em Budapeste, mas tinha dúvidas de que França fosse um país... Decidiu - pelo menos um laivo de esperteza - copiar a resposta. Teve sorte que o miúdo sabia, mas confessou que nunca tinha ouvido falar de um país chamado Hungury, apenas de Turkey (Turquia) - hungry em inglês significa fome e turkey significa peru. É possível ver o video em: www.youtube.com/watch?v=juOQhTuzDQ0.

Na mesma linha também merece ser visto um outro vídeo: Are American Stupid? (www.youtube.com/watch?v=S3X1K93ff51). Segundo se percebe, um repórter de um site humorístico (entretanto desactivado) da ABC vai para a rua fazer algumas perguntas de cultura geral aos seus fellow americans. Ninguém consegue dizer um país começado por 'U', apesar de viverem nos United States of America. Há quem arrisque Yugoslavia e até Utah. Outras pérolas: 'israelismo' é a religião dos israelitas; Fidel Castro é um cantor; Tony Blair é um skater; Kofi Annan talvez seja uma bebida com café (coffee); Alemanha é um dos países do Eixo do Mal; uma mesquita (mosque) é um animal; já houve três guerras mundiais e Hiroshima e Nagasaki são dois lutadores de sumo... Talvez nestas respostas resida o segredo da reeleição de Bush."

Dá que pensar e questionar até que ponto em Portugal as coisas são diferentes...

A Lanterna



Um homem caminhava apressadamente em plena noite e, ao virar uma esquina, tropeçou violentamente com outro que segurava uma lanterna. O que tropeçara começou a repreender o outro com maus modos e já ia dar-lhe um murro, quando se apercebeu de que ele era cego. Então, perguntou:

- Por que diabo anda com essa lanterna se é incapaz de ver seja o que for?

o cego repôs:

- Para aqueles que, tendo olhos, deviam ver, mas nada vêem. para que não sejam tão negligentes. Precisamente, para que me possam ver a mim em vez de chocar comigo.

Quantas vezes reclamamos a atenção dos outros e nem sequer temos a nossa alerta! A atenção ajuda-nos aqui, agora e em qualquer circunstância. Alerta, mas sereno; atento, mas tranquilo. A mente atenta e calma é a mente meditativa, que se abstrai do rebuliço e da dispersão e abre os sentidos para a realidade imediata.

Fonte: Texto retirado integralmente do livro, «Os Melhores Contos Espirituais do Oriente», de Ramiro Calle, edição Esfera dos Livros.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

1000 Razões



Um livro muito interessante veio ter-me ás mãos: "1000 Razões Para Ler Um Livro". A sua história é deveras fascinante. Merece ser contada.
Pediu-se a 1000 pessoas que escrevessem uma razão, cada uma, para lêr um livro! Tudo está compilado neste pequeno manuscrito,em que as verbas resultantes da sua venda revertirão, integralmente, para a criação da primeira Biblioteca Alma Azul, numa aldeia da Beira Baixa com menos de 1000 habitantes. Fascinante!!!

Ao meio do livro, surgiu um separador interessante, que faço questão de descrever:

"MEDITAÇÕES"
Não é necessário saíres da tua casa. Continua á mesa,
ouve. Não ouças sequer, espera simplesmente.
Não esperes, sê absolutamente silencioso.
Acredita que o mundo irá oferecer-se para se desmascarar,
não pode agir de outro modo;
sob o teu encanto, desenrolará os seus anéis a teus pés.
Franz Kafka in Meditações

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Magazine Artes (Fevereiro)


Muitas e interessantes matérias para ler, desde logo:
  1. - a publicação de uma estrevista a Luis Pacheco, in memoriam, que nos faz a retrospectiva da sua vida. (acho deliciosa a história dos 200 contos dados pelo Dr. Mário Soares e de não dar "uma" desde 1975.)
- uma reportagem, "Anjos do Deserto, acerca do Livro "Dona Maria und lhre Träume", com ilustrações de Horst Friedrich, sobre as terras áridas e as paisagens calcinadas dos desertos da Venezuela .
  1. - Em foco, "A intolerância segundo josé Saramago", sobre o espectáculo "In Nomine Dei", levado á cena no centro Andaluz de Teatro, com belas fotografias da peça.

- O Fantasporto 2008, que está aí á porta! Este ano com uma retrospectiva do cinema da Dinamarca.

- Cinema (No Vale de Elah; A caminho de Yuma; Sedução, Conspiração) ; a 2ª Mostra do Documentário Português - Panorama.

- A notícia de uma exposição patente na Faulconer Gallery, Grinnell College, denominada «De onde vens? Arte Portuguesa nos EUA», que além de exposição, contempla debates e concertos musicais.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Drunken Old Woman


Os Gregos eram perfeitos!


Esta escultura, de uma velha bêbada, mostra sem reservas uma mulher envelhecida, cheia de rugas e com a face contorcida, agarrada a um vaso de vinho, contornando belos ornamentos. Data de 190 a.C., sendo atribuida a sua criação, a um tal de Myron.


Costumo dizer, que nos apaixonamos simplesmente por aquilo que achamos perfeito, e eu apaixonei-me por esta imagem, toda a sua expressividade, os seus contornos, o seu simbolismo, o facto de ser estática mas com um "movimento" perpétuo, tudo é extra-ordinário.


Ela impera até doer!


Vem isto a propósito de uma visão que mudou toda a minha maneira de pensar a vida. Há cerca de dois anos, numa véspera de Natal, indo buscar uns amigos para um jantar, deparei-me com um triste mulher, já velha, completamente bêbada, agachada na beira de um caminho, abandonada, isolada de todo o mundo, absolutamente só! Nem gosto de pensar nisso, doeu-me mais a mim do que, possivelmente, a dor que sentia ela naquele momento. Foi tão triste, inesquecível!Inimaginável!

O certo é que, por insistência, cuidamos de chamar a família ou alguém que acudisse. Aquilo mexeu comigo, fez-me sair da redoma em que se encontrava a minha vida, e ver que vivemos num mundo de dor e sofrimento. É incompreensível.

Nunca mais soube dessa pobre mulher, ás vezes acredito que foi apenas uma visão, qual Sidharta e as suas visões fugases, mas não, foi antes uma premonição acerca da vida e da realidade, que é tão dura... Porque será que o belo se associa, ou recorre, tantas vezes á dor?



"Aqui é o Paraíso"

Terminei há dias a leitura deste livro de Philippe Grangereau, baseada no relato de Hyok Kang, sobre a sua vivência na Coreia do Norte.



É um relato contundente, de como uma boa filosofia de pensamento político, o comunismo, é um desastre quando aplicado.



Kim Il Sung e Kim Jong Il, são os dois homens, que sob a capa do comunismo, impõem ao seu povo (ou o que resta dele), uma politica ostracizante e desumana.

Este livro vem decorado com desenhos do jovem narrador, e que expressam uma capacidade impressionante de detalhe e clarividência.
Uma autêntica lição de vida!!!
Recomendo a todos aqueles que vivem na "ilusão" do mundo dos sonhos! Está é uma dura realidade!!!

Conto Espiritual do Oriente



E QUEM TE PRENDE?


Angustiado, o discípulo foi visitar o seu mentor espiritual e perguntou-lhe com uma voz desanimada:

- Como me posso libertar, venerado mestre?

O preceptor respondeu:

- Meu amigo, e quem é que te prende senão a tua mente?


A mente é a grande amarra. Há muitas dificuldades no exterior e na vida quotidiana, mas as piores estão na própria mente. A mente está repleta de obstáculos e impedimentos (ofuscação, avidez, ódio, ciúme, inveja, cólera) que é preciso ir superando, para completar o processo de maturidade emocional e para ir favorecendo a criação de nós mesmos. A mente debate-se numa atmosfera rarefeita de obscurecimentos, medos e tendências neuróticas que geram confusão e dor. O pior inimigo está na mente. Mas a mente que prende é a mente que liberta, e a mente inimiga pode transformar-se em mente amiga se pusermos em prática a via do autoconhecimento e do desenvolvimento da mesma.


Ora nem mais!!!

Fonte: texto integralmente retirado do livro Os Melhores Contos Espirituais do oriente, de Ramiro Calle, Esfera dos Livros, 2006.


domingo, 17 de fevereiro de 2008

Mitos: A Caixa de Pandora


Pandora, a primeira mulher mortal, foi criada por vários deuses, por ordem de Zeus, para espalhar a destruição depois de Prometeu ter roubado o fogo do céu. Hefeso (vulcano) deu-lhe a forma; Afrodite (Vénus) deu-lhe a beleza; Hélio ensinou-a a cantar; Hermes (Mercúrio) ensinou-a a lisonjear e a iludir; e Atena (Minerva) vestiu-a. Embora Prometeu dissesse a Epimeteu que recusasse quaisquer presentes de Zeus, ele aceitou Pandora e casou com ela. Tal como se esperava, ela trouxe o caos, abrindo uma caixa proibida e libertando todos os males do mundo que se encontravam fechados. Só ficou a cega Esperança - Pandora convenceu-a a sair para confortar a humanidade.
Fonte: PHILIP, Neil, Comentar Mitos e Lendas, Dorling Kindersley - Civilização Editores, 2007
Imagem: Pandora, de Dante Gabriel Rossetti (1828-82)

Katie Melua - "Pictures"


Um excelente disco, uma brilhante intérprete.


Depois de ouvirmos 'If You Were A Sailboat', jamais poderemos voltar a ser os mesmos.



A musica é mesmo bonita. O videoclip http://www.youtube.com/watch?v=x25F3-sR2Yo&feature=related é mais bonito ainda, dá-nos uma espécie de visão "naïf" do paraíso. Esta ingenuidade primitiva funciona como uma simbiose de desejos infantis, como uma bela peça de teatro, em que os fantoches melancólicos, somos nós.



Sem dúvida, recomendado!!!

Control de Anton Conbijn


Considerado pelo The Guardian como o melhor filme do ano, Control de Anton Conbijn, retracta a vida e obra de Ian Curtis, o jovem e sempre eterno vocalista dos Joy Division, que aos 23 anos se suicidou, colocando fim a uma breve vida atormentada, não só pelos problemas de epilepsia mas também de amores complexos que parecem transcender a sua própria vontade. Arrisco a dizer, que morreu atormentado pelo êxtase da experiência da vida. Viveu uma vida que não era sua. Tinha tudo, e no entanto era tão novo!!!

Acerca da sua morte, o JN de 18 de Maio de 2005 escreve:

" Há precisamente 25 anos, Ian Curtis, o epicentro criativo dos ingleses Joy Division, suicidou-se. Na noite anterior, tinha pedido à mulher que o deixasse sozinho em casa. Fumou cigarros, esvaziou uma garrafa de whisky, pôs a girar o vinil "The idiot", de Iggy Pop, viu na televisão o filme "The Stroszek", de Werner Herzog, e escreveu uma carta "Já não aguento mais", lia-se, à segunda frase.

Por volta das cinco da madrugada, Ian Curtis colocou uma corda à volta do pescoço e enforcou-se.

Era novo, demasiado novo - tinha 23 anos. O episódio colocou um dramático ponto final na carreira dos Joy Division e, mais do que isso, catapultou o cantor para o estatuto de um dos grandes mitos da história do rock. A sua morte voluntária já foi alvo de inúmeras interpretações, especulações e divagações. Uns dizem que sempre fora seu desejo morrer novo. Outros asseguram que foi o excesso da medicação que Curtis tomava para curar os seus cada vez mais frequentes ataques de epilepsia. E também há quem arrisque dizer que Ian Curtis resolvera desistir de lutar contra os sismos desencadeados por uma relação com uma amante."1

Aconselho todos a lerem "Carícias Distantes" de Deborah Curtis, a biografia de Ian Curtis escrita pela mão da sua própria esposa, mãe do seu filho e mulher traída e abandonada. A páginas tantas do livro, escreve sobre as palavras cortantes de David Hare, que latejavam compulsivamente na cabeça de Ian:
«Não há conforto. A vida tira-nos o ânimo. Temos sonhos de partir e é assim com toda a gente que conheço»,
e mais á frente interrogar-se-á: «Quão infeliz se terá que ser para que a vida pareça pior que a morte?»2
Da antologia poética de Ian Curtis/Joy division, deixo-vos "O Eterno" (1980)
«A procissão prossegue, a gritaria acabou,
Louvor á glória dos amados que se foram.
A falar alto enquanto se sentam ás mesas,
Espalhando flores arrastadas pela chuva.
Fiquei junto ao portão no fundo do jardim,
Vendo-os passar como nuvens no céu,
Tento gritar no ardor do momento,
Possuído por uma fúria que queima por dentro.
Choro como uma criança, e estes anos fizeram-me velho,
Com crianças tenho longamente desbaratado o tempo,
Um fardo a carregar, apesar da sua comunhão inteiror,
Aceite como uma maldição um acordo infeliz.
Brinquei no portão ao fundo do jardim,
Alongo a vista desde a sebe até ao muro,
Não há palavras que expliquem, nem acções que determinem,
Fico-me a observar as árvores e as folhas que caem.»3
Fontes:
1 Jornal de Notícias, de 18 de Maio de 2005.
2 CURTIS, Deborah, Carícias Distantes, Lisboa, Assírio & Alvim, 1996.
3 CURTIS, Ian, DIVISION, Joy, antologia poética, tradução de José Alberto Oliveira, Lisboa, Assirio & Alvim, 1996.

L'Apocalypse Panoramique



Para quem gosta de fotografia, recomendo a publicação francesa PHOTO. Na sua edição n.º 443, a revista publica inéditos da obra do fotógrafo David Lachapelle, que esteve patente numa exposição em Milão, com destaque para L'Apocalypse Panoramique, a sua mais recente criação.
David Lachapelle é considerado "o fotógrafo das celebridades" ou, como o descreveu o NYT, "o Fellini da fotografia".
Para acompanhar melhor a sua obra, visitem o seu site na internet http://www.davidlachapelle.com/home.html

Jorge Reis-Sá



Sexta-feira, 15 de Fevereiro de 2008, conferência com o autor.

Conheci o homem e revelo aqui uma inconfidência: não consigo compreendê-lo!

É um homem inteligente, interessante, por vezes brilhante, mas de uma sensibilidade mecanizada, ou seja, algo elaborada, algo fictícia ou melhor, uma tentativa utópica de ser assim. Eu não acredito! Seria legitimar Platão na sua condenação aos Poetas. E reforçei esta ideia, depois de ler "Vou para casa", o livro que o autor gentilmente me ofereceu. A melancolia de um desejo que não chegou, esse desejo incongruente de viver aquilo que se pode ter vivido, mas vivê-lo sentindo o que se quer sentir. Na verdade, ao saborear o livro, pensei estar a ler Baudelaire e as suas saborosas "Flores do mal", ou ainda "Sands at Seventy" do fabuloso Walt Whitman, mas não, é simplesmente um homem que deseja ardentemente chegar a casa. Qual Ulisses desejoso de chegar á bela Ítaca.

Deixo-vos o fabuloso "O Aparador":

"A casa está escondida por entre a vegetação. Há no bosque um limite para a verdade.

Lá dentro, o aparador tem o pó dos anos. A Casa na árvore desapareceu. A vida trouxe o passado. O melhor sentido das coisas é a sua memória."1

1 - Fonte: REIS-SÁ, Jorge, Vou para Casa, Edições Quasi, 2008.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

O Homem da minha Terra



Nascido nos confins mais remotos deste mundo, nesta verdejante terra abarcada por intimidantes bosques que nos fazem sonhar, eis a fértil casa do homem mais ilustre da minha terra: Tomáz Pereira.

Nascido no longínquo ano de 1641, em Vale S. Martinho, Tomáz Pereira foi, talvez, um jovem como todos os outros, na sua época. Viveu interiorizando na sua individualidade, a religiosidade colectiva de um povo, outrora tal como ainda hoje, subordinado a uma escravidão moral, perpetuada por uma ausência de razão e pela imposição de mitos como factor privilegiado da vivência e da experiência humana.

Todo esse ambiente, um tanto ou quanto escatológico, fez nascer em si uma ambição missionária de converter o mundo á sua própria fé. Talvez fascinado por um idealismo lúdico, elitista e cerimonial, converteu-se á mais importante ordem religiosa cristã: os Jesuitas.
Foi a 25 de Setembro de 1663, imbuído nesse espírito supra-religioso, quase metafísico, que ingressou na Companhia de Jesus, sendo admitido no Convento de Coimbra. Passados três anos, em 1666, embarca para a India, afim de desenvolver o seu espírito missionário e levar além mar a sua palavra de fé. Ao que consta, tudo lhe correra da melhor forma, era admirado por todos aqueles que o rodeavam devido, em grande parte, á sua capacidade criativa, ao seu espírito de missão e á sua proeminente perspicácia oratória. Já aí se denotava as suas qualidades diplomáticas.
Pouco se sabe da sua estada na India, no entanto, em 1672 e atendendo ao interesse manifestado pelo Imperador Chinês Chang-Hi (Dinastia Ming), desembarca na China.
Tomáz Pereira foi o primeiro homem a introduzir na China a teoria musical ocidental. Este pormenor tornou-o amigo íntimo do Imperador, que o cumulou de honrarias. A maior de todas foi, sem dúvida, o tê-lo feito responsável pelo primeiro documento diplomático entre a Ásia e a Europa (o tratado Sino-Russo de Nerchinsk, 1689). Foi assim feito mandarim, a maior de todas as honras na China Imperial.
A sua amizade, dedicação e devoção ao Imperador, deu os frutos que mais desejava, e em 1692 consegue com que o Imperador introduza na China, a primeira lei de liberdade religiosa. Em agradecimento, o Jesuita escreve ao Imperador:
"Era este o nosso único desejo, a só esperança que nos ia sustentando e o termo a que nos encaminham dia e noite os nossos pensamentos e aspirações: chegar ao felicíssimo momento em que, por graça de Vossa Magestade, nos fora outorgada a liberdade de pregar publicamente neste vasto império o culto do Verdadeiro Deus. Por este motivo, bem o sabe Vossa Magestade, deixámos nossas familias e nossas Pátrias e viemos através de tantos perigos colocar-nos ao serviço de Vossa Magestade. Já nos tinha cumulado de favores sem conta mas a graça que hoje nos faz, excede-os a todos e lhes vem pôr o remate."
Este padre, que chegou a ser presidente do Observatório Astronómico Chinês, centro nevrálgico do pensamento ciêntífico Chinês do Séc. XVII, morreu em 1708 e como última das honrarias do Imperador, este mandou fazer a lápide do seu túmulo e escreveu ele próprio o epitáfio: "foste um perito em música e no calendário, os instrumentos que construíste foram todos oportunos...".
Em 1997, aquando da visita do Presidente da República, Jorge Sampaio, á China, o então ministro Chinês da ciência indicou o nome de Tomáz Pereira para baptizar um instituto de história e ciência Chinês.
Em 2008, Portugal e a China assinalam os trezentos anos da morte deste homem. Um homem práticamente desconhecido no seu País, mas que a sua vida transcênde a nossa tentativa de o conhecer, compreender e admirar.

A Causa Primeira


A génese deste caminho, que se espera longo e profícuo, proveio da necessidade de exprimir e registar, o que de mais belo e interessante se passa nesta fértil experiência que é a vida.

Acompanham-me neste trajecto, todos aqueles que comigo compartilham da ideia, de que o mundo se faz pensando. As pedras que sustentarão esta calçada, serão sobretudo de matriz reflectiva, opiniões, curiosidade, divulgação poética, filosófica e cultural, e tudo o resto.

Sejam bem-vindos a esta aventura, que espero fantástica e alucinante. Aceito e agradeço o contributo de todos vós para esta simples mas delicada jornada.
Para finalizar este primeiro post, deixo uma máxima de François de La Rochefoucauld, retirada do manuscrito de Liancourt: "Como os mais felizes do mundo são aqueles que precisam de pouco, os grandes e os ambiciosos são, deste ponto de vista, os mais miseráveis, porque precisam de angariar uma infinidade de bens para se sentirem felizes".1

1 ROCHEFOUCAULD, François de La, Máximas e Reflexões Morais, Prefácio, tradução e notas de Raúl Mesquita, Lisboa, Edições Sílabo, 2008 .